
Mais um dia, mais uma semana, mais uma luta ...
Ainda hoje vi a casa onde cresci destruída.
Ainda bem que não ouvi o ruído das coisas a partirem, a quebrarem, as paredes a ruirem. Isso era demasiado doloroso.
Mais de 20 e tal anos de memórias, de risos, de brincadeiras, feridas em cima de feridas, os coelhinhos, o chão de pó morno do quintal, e a miudagem de pé descalço, os verões de gelados de gelo 'pintado' para a miudagem do páteo da minha avó.. O cão da minha avó, os meus manos, a minha tia, e a minha avó... sempre a dizer quando eu ia pra casa:
- Ó filha vai pela rua da frente.. tu não tens medo de ir por aí? É tão escuro.
Eu não tinha.
A rua era sempre a direito a subir e dava para a minha casa. É verdade que raramente havia alguém por lá e era mesmo isso que eu gostava naquele caminho.
Desde muito novinha que sempre gostei de escolher os meus 'caminhos'.
- Não tenhas medo que eu não tenho 'vó! Té logo!
E lá subia a rua para a minha casa...
Hoje quando passei lá na rua e vi tudo terraplanado não vi a minha avó a dizer-me adeus...
- Pelo menos hà 8 anos que não diz otária!
Certo, fez em Fevereiro 8 anos que ela foi embora mas eu olhava sempre e 'via' uma sombra que me dizia pra ter cuidado.
Hoje não tava.
Nem vai estar mais.
Adeus avó.
Descansa em paz.
6 comentários:
Empatizo com o que dizes porque já passei por uma situação semelhante. Momentos que passam e que na altura são banais mas com o passar dos tempos e com a mudança, tornam-se estremamente importantes por fazerem parte da memória. A memória dos lugares que percorremos e que de alguma forma afectam a nossa vida, tornam-se ainda mais importantes quando ligadas a pessoas que marcam a nossa vida. Talvez já não vejas essa sombra, mas ela estará sempre na tua memória que evocarás sempre que passares nesse lugar.
As memórias, as recordações estarão sempre ai... a casa pode ter desaparecido, a tua avó pode já não estar junto a ti... mas as recordações, os momentos, estarão sempre gravados em ti!!
Beijo
Até me fizeste arrepiar.
A casa, a avó, o espaço, aquele ponto georeferênciado na nossa alma.
É verdade. Alí cresceste, alí já foste feliz em familia, num lugar onde ainda paravam os pássaros para cantar.
Não consigo desassociar a casa da avó, ela enchia uma casa, com o seu carácter, determinação, a sua força de viver. Sinto que são os sinais da avó que se escapam, e se transforma em alma, no entanto,que a força da avó prevalessa para além das mazelas que os escombros possam provocar.
Beijinhos do mano Miguel.
Que essa sombra te acompanhe sempre... o adeus, o 'cuidado!'... as recordações são boas qdo não nos fazem sofrer!! Bjs.
Pode já não estar entre nós, mas acredito que a tua avó continue a zelar por ti... E continuará sempre, enquanto viver na tua memória... Ama tu*******
Um dia também tu terás um chão morno para outros pés pequeninos pisarem , um dia também dirás a alguém para seguir pela rua da frente e esse alguém fixará na memória o teu olhar , um dia também tu poderás ser a "avó" de alguém e aí sentirás que a vida é este construir sobre o terreno que alguém deixou na nossa alma , que a casa que constróis dentro de ti tem vários tijolos de outra casa demolida . Gostei muito do teu texto . Bjinhos
Enviar um comentário